Propulsor Diesel a Gás Líquido da Wartsila
O notável artigo publicado na RM 974 da autoria do Dr. Engº. Naval Jorge M. G. Antunes “Os Motores Navais de Hoje: 100 anos de Evolução” , além de interessante e elucidativo, suscitou-me a vontade de escrever sobre as polémicas em curso no Governo Alemão, Parlamento Europeu e Comissões da União Europeia a respeito da poluição atmosférica produzida pelos navios mercantes.
O assunto tem sido descrito em vários meios de comunicação como a revista alemã “Der Spiegel”, a revista técnica também alemã “Maritim” e muita coisa chegou-me aos ouvidos através da rádio “Deutschland Funk”.
Tal como nos diz, no mesmo número da RM, a jurista Clotilde Celorico Palma no seu excelente artigo intitulado “O Registo Internacional de Navios da Madeira”, “cerca de 90% do comércio entre a UE e o resto do Mundo é transportado por via marítima e eu acrescentaria em uns bons milhares de navios. Contudo, várias fontes dizem-nos que a poluição atmosférica produzida pelos navios não é muito significativa, sendo da ordem dos 3% do dióxido de carbono total produzido pelas atividades humanas, 6% dos óxidos de enxofre e 15% de óxidos de azoto.
Não parecendo muito grande esta poluição, ela não deixa de ser localmente gigantesca porque a navegação é feita em rotas determinadas por todos os navios, existindo lugares em que a fuligem negra dos diversos poluentes negros de hidrocarbonetos e amarelos dos óxidos de enxofre como que tapam o sol e atingem zonas marítimas como as margens do Rio Elba nas proximidades do porto de Hamburgo. O Canal da Mancha, o Mar do Norte, o Mar Báltico, o Bósforo e Dardanelos, o Estreito de Malaca e os canais como o de Suez e Panamá, além dos grandes portes asiáticos, europeus e americanos são pois áreas altamente poluídas pela navegação.
Ao contrário do que muitos leigos pensam, os grandes motores Diesel não consomem o gasóleo limpo de acordo com as normas comunitárias das viaturas terrestres e nem sequer o chamado gasóleo marítimo ligeiramente menos purificado para uso de pequenas embarcações d e pesca e recreio. Usam sim um óleo pesado, ou seja, o resíduo do que fica da destilação de gasolina e gasóleo que é mais ou menos o que queimam muitas cimenteiras e centrais térmicas. Esse óleo pesado, denominado pelos alemães de “Pampe”, é extremamente viscoso pelo que deve ser aquecido a 50ºC para ser bombeado para os cilindros dos grandes motores Diesel dos porta-contentores, navios de cruzeiro e petroleiros.
Uma tonelada do “Pampe” custa cerca de 600 dólares e a mesma quantidade de gasóleo marítima chega a ultrapassar os 900 dólares. Os grandes navios porta-contentores consomem cerca de 10 toneladas de combustível por hora, o que daria umas 5 mil toneladas numa viagem da China para o Norte da Europa. Os mais pequenos, mas já grandes, “ferrys” do Báltico consomem duas toneladas por hora de navegação. Como a partir de 2015, o teor em óxidos de enxofre emitidos pelas chaminés dos navios terá de sofrer uma redução dos atuais 1% para 0,1%, se todos os governos estiverem de acordo, então, seria inevitável a conversão para o gasóleo marítimo ou de preferência para o gás natural liquefeito que reduz esse teor para 0%. Com o gasóleo, o combustível passaria a custar entre metade a dois terços da despesa operacional do navio. Sabendo-se que as tripulações são muito menores hoje em dia e, como tal, o número de salários, o custo do capital e combustível acaba por ser determinante. A fatura do transporte pode aumentar em mais de 500 mil euros nos percursos curtos nos mares do Norte e Báltico. Segundo alguns especialistas, isso poderia levar os transportadores a utilizarem mais os camiões TIR que podem rolar da Noruega e Suécia para a Dinamarca pela ponte-túnel que liga a Suécia à Dinamarca com consequências ecológicas não despicientes.
Além disso, os gasóleos líquidos são de preço muito instável, enquanto o óleo pesado mantém o seu preço sem grandes alterações durante mais tempo e não implica qualquer alteração nos navios. Os contratos com os fornecedores das bancas de óleo pesados são feitos a longo prazo com regras mais adequadas aos interesses dos clientes porque a indústria química mundial não pode utilizar todo o óleo pesado das refinarias para transformar em plásticos e borrachas sintéticas, fibras, etc.
Há pois a vontade de proibir o fumo dos navios em determinados zonas, o que seria conseguido com a utilização nos cilindros dos motores Diesel de gás natural liquefeito. A empresa americana Caterpilar colocou em exposição em Rostock um motor Diesel de seis cilindros com uma potência de cinco megawats a funcionar continuamente com os dois combustíveis, mostrando que o seu motor passa do óleo pesado para o gás liquefeito sem parar e quando utiliza gás não produz quase qualquer poluição atmosférica. A ideia é pois utilizar o óleo pesado no alto-mar e o gás nas aproximações a portos ou em canais, mares pequenos, etc.
Esta solução é defendida por muito oceanógrafos que vão ao ponto de pretenderem apenas a utilização do gás natural e pelo IMO (International Maritime Organisation) que considera o Mar do Norte e o Báltico como zonas de controlo de emissões poluentes. No Mar Báltico há já ferrys escandinavos que funcionam apenas a gás natural liquefeito, mas os grandes armadores opõe-se a isso, dado considerarem quase impossível equipar um navio atual com depósitos para quantidades suficientes de gás natural liquefeito depois de arrefecido a -160 graus C e mantido a uma pressão de 200 bares para produzir a mesma energia por litro que os outros combustíveis. Isso implica novos tanques que vão retirar capacidade de carga e torna-se caro porque terão de ser construídos em aço resistente a alta pressão e atualmente vive-se também uma crise do ”shipping” inserida na crise global da “redução tendencial das margens de lucro” conforme Marx explicou com as suas célebres fórmulas das taxas de mais-valias e relação entre capital fixo e variável (salários) e que os economistas modernos designam de PER (Price Earning Ratio).
Um estudo da Associação de Armadores Alemães considerou que seria uma boa solução e aconselhável, mas financeiramente impraticável em termos de custo de construção apesar de o gás natural liquefeito ser mais barato que o gasóleo líquido e estar nos EUA já ao nível do óleo pesado, sendo, contudo, admissível uma baixa dos preços do óleo pesado se o consumo naval sofrer uma forte redução.
Tecnicamente seria mais fácil construir de raiz navios para utilizarem o gás natural e o óleo pesado, mas, segundo os armadores alemães, o custo dos navios aumentaria em 15 a 20C%, logo em muitos milhões de euros ou dólares, o que pode ser exagerado dado não haver um grande navio a funcionar a gás liquefeito e, como tal, serem desconhecidos os custos reais de construção e operação. Mais barato e fácil seria a construção de navios apenas para o consumo de gás natural liquefeito.
Mas, as contas dos armadores podem sair furadas porque o governo da senhora Merkel descobriu aqui um meio para cobrar novas taxas. A partir de 2015, os governantes alemães não pretendem tornar os navios a gás líquido mais baratos com redução de impostos e taxas de acostagem, mas antes cobrar taxas aos muitos navios atuais. Nada como os governos liberais de direita para encontrarem meios de taxar as economias. Portugal, nesse aspeto, não tem querido ficar atrás da Alemanha. Só que a ministra do Mar ainda não ouviu falar destas coisas.
Todos os navios a óleos pesados que demandem portos da União serão taxadas como poluentes, devendo a solução partir, como de costume, da União Europeia para evitar a concorrência entre portos mais caros ou mais baratos.
Dieter Dellinger - Revista de Marinha
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